PODE A REVISÃO DO PDM SER O TIRO DE PARTIDA PARA UMA NOVA CASCAIS?
As questões
relacionadas com o Planeamento são de uma importância extrema para o futuro de
um território.
Cascais tem
pretensões, anseia por ocupar um lugar de destaque a nível regional, nacional e
internacional, que já foi seu, que o perdeu e que tarda em reencontrar.
A revisão do PDM
podia ser o tiro de partida para uma nova Cascais, moderna, vanguardista,
dinâmica, ambientalista, focalizada em poucos objectivos mas determinantes.
Se o será ou não,
vamos discutir e avaliar se os objectivos estão sintonizados com os meios e os
procedimentos utilizados.
Quero antes de mais
afirmar a minha concordância com grande parte das ideias chave já apresentadas
e aplaudir os responsáveis pelo desenvolvimento deste processo.
Já referi que é
tardio o arranque desta revisão anunciada na campanha eleitoral de 2002 (!) mas
se chegar a bons resultados, se for o garante de uma viragem na gestão do
território, pode valer a pena.
Os elementos
disponíveis no site da CMC, são no
entanto algo redutores. Estão disponíveis as caracterizações do território, físico
e social, e um Relatório do Estudo de Caracterização do PDM que contém algumas
pistas de orientação pretendida mas que são eminentemente genéricas.
Ao iniciar a discussão desta matéria tão sensível,
seria de esperar que a CMC tivesse já elaborado um conjunto de propostas mais
concretizadoras, tivesse ideias mais afinadas para as medidas concretas que
entende implementar.
Engano. Tudo muito
genérico, o que muito dificulta a participação dos munícipes em geral nesta
discussão.
E aqui entronca uma
preocupação que não vejo os responsáveis camarários terem, nem neste assunto
nem em outros.
A participação dos
munícipes na gestão do futuro do território deveria ser promovida, incentivada,
acarinhada, apoiada.
A democracia é a
essência da participação das pessoas na coisa pública, não se pode cingir à
mera participação em eleições!
Este estilo de
liderança que o actual Presidente da Câmara Municipal de Cascais tem vindo a
promover é indiciador da negação deste princípio.
A verdade absoluta, as certezas e a genialidade das
ideias está confinada ao Presidente e aos mais próximos colaboradores deixando
para o resto dos mortais a “liberdade” de aclamarem tal clarividência ou se
resumirem a ficarem no seu canto a carpir as discordâncias, e desde que o
carpir não seja demasiado ruidoso…
Isto é a negação da
liberdade democrática na sua essência!
Mas este mal já vem
de longe.
Li há pouco tempo
uma intervenção de Antero de Quental sobre as razões que no seu entender
ditaram a decadência dos estados ibéricos, Portugal e Espanha. Confesso a minha
concordância com muitos dos argumentos apresentados.
Gostaria de
ressaltar um, que se aplica muito bem aos tempos que vivemos em Cascais e até
em Portugal.
Antero de Quental
defende que o povo Ibérico foi grande até ao século XV enquanto manteve uma
governança em que era dada a voz e a possibilidade de participação activa à
totalidade da população. A participação crítica dava espaço à criatividade, ao
empreendedorismo, à ciência, à formação das pessoas. Ao invés, com o dealbar do
século XVI e um estilo de governo absolutista, retirou-se a voz ao povo e tudo
passou a girar à volta de um Rei e uma aristocracia corrupta e esbanjadora, sem
iniciativa e aduladora em troca de benesses. Perdeu-se o hábito de ter opinião
e acima de tudo de a poder expressar em liberdade.
A inquisição de então,
onde todos os crimes de consciência foram perpetrados em nome de uma religião
cheia de dogmas e pouco inteligente e inteligível, manteve-se embora com outras
roupagens.
Hoje, já ninguém
vai para a fogueira por acusação de heresia, mas todos sabemos o que acontece
aos poucos que ousam dizer que não estão de acordo…
Ora a apatia que
hoje se vive em Cascais e em Portugal tem muito a haver com a perda ao longo
dos anos de uma cultura verdadeiramente democrática de trazer as pessoas a
participar nas decisões de interesse para a comunidade em que estão inseridos.
Essa apatia
converteu-se numa falta de capacidade crítica construtiva, de desinteresse por
inovar, de incapacidade de pensar grande, de pensar para o futuro.
As pessoas precisam
de se interessar pelo seu futuro e isso só acontecerá se forem chamadas a
participar na sua construção. Enquanto tal não acontece todos ficarão à espera
que “o iluminado” decida por eles.
Os dirigentes políticos
dividem-se em dois tipos: os que pretendem ser “os iluminados” e os que
pretendem ser dirigentes.
Os segundos, em
menor número, não vêem a participação dos concidadãos nas decisões como perda
de autoridade, porque sempre entenderam que o seu papel é mandar, apurada que
esteja a orientação pretendida pela maioria das pessoas!
Dito isto não se
percebe que não estejam ainda devidamente divulgadas as sessões em que os munícipes
poderão participar activamente na discussão do PDM e das suas linhas
orientadoras, porque é que os cidadãos que estão envolvidos em participações
sociais, como sejam as colectividades ou as instituições de solidariedade
social não são chamados a dinamizar a participação das pessoas ligadas às
instituições onde desempenham tarefas, porque é que as comunidades escolares não
são chamadas a participar (professores, associações de pais, alunos), as
empresas ou as Juntas de Freguesia não são chamadas a desempenhar um papel
fundamental de apelar à participação massiva da população cascalense!
Gerir as múltiplas opiniões e as divergências motivadas
por interesses antagónicos é muito mais difícil do que impor uma opinião.
Nisso estamos todos
de acordo.
Mas é essa a
democracia em que pretendemos viver?
Enquanto não
resolvermos esta necessidade de abandonar a apatia e voltar a ter a capacidade
de pensar não iremos sair da cepa torta!
Nem em Cascais, nem
no País!
Comentários
Enviar um comentário